quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

Ovelha Negra

Como eu falei antes, o titulo "A garota nova" era um titulo provisório enquanto eu não arranjava coisa melhor... Aceitando uma sugestão, ficará esse que é bem melhor que o anterior... ;)




Capítulo 01

A primeira coisa que uma pessoa via quando chegasse na entrada do CSP era uma linda fonte onde havia uma estátua de um anjo esculpida em mármore. A fonte ficava logo depois do portão de entrada e surpreendia a todos a que olhavam para ela, mesmo aqueles que já tinham ouvido falar.
Construída em 1954 como um presente do antigo dono da propriedade a sua mulher, um presente de casamento. Um anjo esculpido com sua face. Ao menos era isso o que dizia no folhetim que recebi da escola. Sim, eu li o folhetim.
Sei que isso não é o tipo de coisa que alunos fazem, mas eu queria reunir o máximo de informações possíveis antes de chegar na escola. Afinal de contas, eu iria entrar na escola durante o meio do ano, não era uma coisa boa de fazer.
Entrar na CSP é extremamente difícil, porque eles são extremamente seletivos com seus alunos E professores pelo o que eu ouvi. É quase como uma faculdade antecipada. É preciso uma prova pra entrar, além de ter um histórico escolar quase que impecável e ainda assim, é difícil, pois as vagas são para poucos.
Encarando os fatos eu só entrei por causa do meu pai. Ele é um agente militar condecorado várias vezes por serviços prestados ao país. Então sim, só mesmo alguém de tamanha importância pra conseguir uma vaga na CSP bem no meio do ano. Então como você já deve ter percebido, isso não acontece com freqüência na escola. Provavelmente será algo que todos já devem saber, toda a escola, que não é exatamente pequena.
“Senhorita Oliveira, aguarde aqui um instante, em poucos minutos o diretor irá atendê-la” disse um dos soldados que bajulavam o meu pai pra mim. Ele sorriu, mas eu não sorri de volta. Não tinha por quê.
“Tudo bem” respondi e vaguei meu olhar pelo lugar. Era certamente um lugar bonito. Ao menos até onde eu já tinha visto. Agora eu me encontrava fora do lado da sala do diretor, onde tinha uma recepcionista me encarando de forma bem chata. Era curiosidade e ao mesmo tempo... Medo?! Céus, fico pensando o tipo de boato que já espalharam.
O lugar não tinha muito pra olhar, o principal eram os quadros de arte na parede. Havia uns 3 ou 4 quadros que certamente despertaram a minha atenção. O primeiro era de uma mulher sentada em um degrau fora de uma casa com um tom sombrio e ela parecia estar triste, chorando, mas havia um sorriso discreto em seu rosto. O que me leva a pensar porque um artista pintaria tal desincronia. O segundo era de uma floresta onde as arvores não tinham folhas e havia uma mulher parecida com a do primeiro quadro, só que agora ela estava em um vestido preto em camadas e estava de costas. Era tão intrigante quanto o outro. O que ela estaria fazendo numa floresta assim, vestida assim, à noite?
E o terceiro, bem, o terceiro não era de uma mulher. Era uma garota. Uma criança. Meio parecida com a dos quadros anteriores, mas claramente não era a mesma pessoa. A dos dois outros quadros tinham olhos azuis brilhantes, a dessa criança eram castanhos e havia um brilho no olhar que a tornava especial. O restante do quadro era simples, um parquinho onde havia várias outras crianças brincando e sorrindo, mas esta em particular estava olhava pra quem estava olhando o quadro. Parecia quase que como uma fotografia de tão perfeito e preciso o quadro. E o quarto...
“Ah, senhor Sales, que bom que o senhor chegou. Está atrasado! O diretor quer falar com você e... O que aconteceu com suas vestes? É melhor se arrumar antes de ir falar com o diretor e principalmente, antes que um dos alunos veja você desse jeito” uma voz menina falou para algum cara que certamente tinha aparecido. Evitei virar de vez pra não parecer bisbilhoteira e resolvi que olhar de rabo era melhor.
E fiquei realmente surpresa com o que pude ver. Havia um cara em frente a tal recepcionista e meu deus, que cara! Não dava pra ver se ele era bonito, mas forte e músculo totalmente dava pra ver. Ao contrário dos homens que eu tinha visto por aqui, ele estava com a camisa pra fora da calça e a gravata apenas em volta do pescoço, sem nó algum. O cabelo estava todo desarrumado e a camisa parecia que ele tinha dormido com ela. Quando eu vi que ele me olhou, eu olhei rapidamente de volta para os quadros, tentando concluir minhas análises e ignorá-lo.
Logicamente que eu não consegui me concentrar na análise de novo. Eu estava querendo era dar mais uma espiadinha nele. Que tipo de problema será que ele tinha se metido pro diretor querer falar com ele? Não consegui imaginar nenhum aluno do CSP se metendo em problemas a ponto de ser levado para o diretor. Não eram todos alunos modelos?!
Quando resolvi ceder a tentação de olhar de novo para o tal cara misterioso eu percebi que não havia mais ninguém na recepção. Nem ele e nem a recepcionista. Onde será que tinham ido?
“Procurando-me?” uma voz masculina e forte falou ao meu lado e eu soltei um gritinho de susto. Ele apenas me olhou sorrindo. Era o tal cara e ele não era apenas bonito, ele era LINDO. Do tipo de cara que é modelo. Do tipo de cara que é ator. Do tipo de cara que está na capa das revistas e que nos faz suspirar e desejar ter. “Desculpe-me por tê-la assustado. Bonitos não?” ele falou indicando o queixo para os quadros. “Também adoro eles” e deu um suspiro estranho.
“São... Fascinantes e misteriosos, isso me atrai, eu acho” dei de ombros e ele apenas ficou me encarando.
“Uau. É a primeira pessoa que eu vejo dizendo que eles não são óbvios demais” ele riu de novo. Será que ele tinha pensado que eu havia falado alguma besteira pra rir assim? Eu sei que não falei. Tolas as pessoas que vêem isso como algo simples, não são nenhum pouco.
“Como alguém pode dizer isso? E são tão bem pintados... Quer dizer, olha isso” apontei pro vestido em camadas da mulher do segundo quadro. Ele apenas assentiu olhando deslumbrado e ao mesmo tempo... Triste?
“Você realmente tem um bom gosto garota” ele sorriu amistoso e então me estendeu a mão. “Enzo, Enzo Sales” e eu olhei pra mão dele e respondi apenas um “Olá Enzo, eu me chamo...” nem precisei responder porque alguém respondeu por mim.
“Catarina Oliveira! Que imenso prazer recebê-la” um velho gordo, barrigudo, de cabelos brancos, alto, bem vestido e bem, lindo, abriu os braços pra me receber. Era o diretor.
“Olá senhor. Muito obrigada por me receber aqui no CSP ainda mais em tais circunstâncias” disse minha fala ensaiada a qual meu pai me obrigou. “Sei que não deve ter sido fácil, agradeço muito” dei-lhe um sorriso falso, mas ao menos tentei aparentar sinceridade.
“Oh senhorita. Com notas como a sua, um histórico escolar como o seu, certamente não foi tão difícil assim não é mesmo? Definitivamente é do tipo de alunas como você que estamos precisando aqui no CSP” ele sorriu sinceramente. É, talvez eu goste dele. Durante todos esses anos acho que me acostumei tanto as falsidades que quase nem lembrava mais de um sorriso verdadeiro.
“Espero que eu renda bons frutos aqui, senhor” sorri e dessa vez mais sincera. Eu reparei no sorrisinho de deboche na cara do cara ao meu lado, do Enzo durante todo o diálogo com o diretor. Olhando agora, até que eles dois se pareciam um pouco. Quer dizer, o Enzo era tão alto quanto ele e ambos tinham os mesmos olhos azuis. Só que o Enzo era loiro, e o cara tinha já os seus cabelos brancos, e enquanto o Enzo tinha músculo, o cara gorduras.
“E com certeza renderá senhorita. Esta é a chave do seu quarto, peça para a senhorita Medeiros mostrá-la onde fica. Ela é a moça da recepção” ele completou sua fala e quando disse sobre a recepcionista, não pude deixar de notar que suas pupilas dilataram e um certo sorrisinho apareceu em seu rosto.
“Oh certo. Eu irei, senhor” e acenei para ele cumprimentando-o com a cabeça e então me virei para olhar pra o Enzo. Eu sorri e murmurei pra ele um “te vejo depois, boa sorte” e ele sorriu de volta, depois um leve tom de vermelho surgiu em suas bochechas e murmurou de volta um “obrigado”.
“Minha sala, Enzo” o diretor mudou seu tom de voz completamente pelo o que pude notar. Era frio e de certa forma parecia desprezo, mas nem tive muito tempo de pensar nisso, porque eu tinha a minha própria vida pra me preocupar do que com um garoto qualquer, mesmo um muito lindo. Certamente ele sabia se cuidar sozinho.
Quando eu cheguei na recepção a moça estava sentada lá mexendo no computador com uma cara séria. Parecia bem importante porque ela estava tentando se concentrar bastante. Mas ao mesmo tempo, era algo que ela estava gostando de fazer, não era daquele tipo de trabalho chato E difícil.
“Err... Senhorita Medeiros” eu a chamei e esperei. Ela demorou uns 5 segundos antes de olhar pra mim e ficou surpresa ao ver que era eu, eu achei.
“Pois não?” era engraçado ouvir esse “pois não” eu sempre achei. Não sei, sempre soou bem falso pra mim e uma forma de manter as pessoas bem distantes.
“O diretor falou para a senhorita me mostrar o meu quarto. Ele já me deu a chave” mostrei a chave pra ela e seus olhos indicavam surpresa.
“Novata e já tem um quarto exclusivo? Deve ser mesmo alguém importante” e levou as mãos aos lábios na mesma hora em que disse isso. Eu ri. Era sempre o gesto que crianças pequenas faziam quando contavam mentiras. Só que o dela nada teve a ver com mentiras e sim, excessiva sinceridade. É, talvez eu gostasse dela.
“Isso é raro por aqui? Ter seu próprio quarto?”
“Somente os professores tem seus próprios quartos. E ainda assim, nem todos eles o possuem. A maioria é compartilhado. Alunos... Não, nenhum deles tem quarto próprio” ela disse indicando com a cabeça a direção certa a seguir.
Era só questão de tempo até essa informação de quarto exclusivo vazar. E se bem conheço adolescentes, até vários deles começarem a querer ter esse mesmo privilégio o que me leva a pensar em qual justificativa o diretor dará. Será certamente muito interessante.
“Então... Quem é você?” ela me perguntou. O engraçado é que ela parecia pensar que eu tinha alguma coisa super interessante e empolgante, como alguma atriz famosa ou sei lá, algo do tipo, algo excitante. Mas acontece que... Não tem nada muito excitante sobre quem eu sou. Quer dizer, tirando o meu dom. Nada demais.
“Hum... Meu nome é Catarina Oliveira” falei mesmo já sabendo que não era isso o que ela queria saber. Provavelmente ela já sabia, já que ela trabalhava para o diretor.
“Eu sei seu nome. Não foi isso que eu perguntei. Quero dizer, me desculpe pelo tom informal, é que nessa escola é formalidades o tempo todo, e eu nem sou assim tão mais velha que você. E eu realmente estou curiosa. Estão dizendo todo tipo de coisa por aí. Inclusive que você é uma filha bastarda do presidente, isso é verdade?” a excitação na voz dela era mais do que clara. Eu apenas ri.
“Não, desculpe” dei de ombros rindo. “Meu pai é militar” dei de ombros de novo. Ela apenas soltou um “ah” de decepção.
“É, aqui tem muitos filhos de militares” e eu realmente não duvidava. Mas é claro, algo como ela devia estar pensando, me tornava diferente dos outros. Porque bem, meu pai era diferente dos outros e não é do tipo de informação que estou autorizada a sair falando, até porque, nem eu sei da história toda, pro meu próprio bem e do país. É o que eles, o governo, e meu pai dizem.
“Qual o seu primeiro nome?” perguntei pra ela e ela pareceu bem surpresa. Eu vivi a minha vida toda em meio as formalidades, eu gostava do informal pra variar.
“Letícia” ela sorriu feliz.
“Certo Letícia e há quanto tempo você tem um caso com o diretor?” sei que fui direta demais, mas era algo que eu gostaria de saber e minha pergunta chocou ela mais do que qualquer outra coisa.
“Eu não... Eu não... Nós não... Por que você está perguntando isso?” ela decidiu responder por fim já que a frase do “eu não tenho um caso com ele” não funcionou. Se ela soubesse do meu dom, saberia que nenhuma outra frase funcionaria.
“Digamos que... Eu apenas seja muito perceptiva e saquei quando ele me falou pra ir até você” eu pisquei pra ela e suas bochechas ficaram rosadas.
“Como ele falou de mim?” seus olhos brilhavam tanto em satisfação e excitação que chegava a ser patético. Um patético bonitinho.
“De forma que definitivamente dá pra ver que ele sente algo por você e pelo visto, você por ele e não é algo... Por diversão, nem da sua parte e muito menos da dele” sorri feliz comigo mesma ao perceber a felicidade nos olhos dela. Ao menos algum bem minhas habilidades faziam a alguém.
“Desde antes de eu ter 18 anos. Mas... Ele é um homem direito. Esperou eu completar 18 anos antes de sequer me beijar. Antes dos meus 18, ele parecia mais um pai pra mim. Ainda mais que... Meu pai morreu quando eu tinha 12, então o Paulo, o diretor, foi como um pai pra mim. Logicamente eu me sentia muito atraída por ele, tentei beijá-lo diversas vezes, mas ele me disse que não podia, que deveríamos fazer as coisas do jeito certo. E isso seria esperar até eu ser maior de idade e ele realmente esperou” ela completou com felicidade. Ela estava mesmo falando a verdade, mesmo sendo difícil de acreditar um homem sendo tão digno assim.
“Vejo que sim, bom, sorte sua. Outra coisa, conhece todo mundo por aqui não? Sabe das últimas fofocas?” afinal, qualquer garota que se preze, bem sabe que deve estar sempre informada sobre tudo e todos e evitar surpresas desagradáveis.
“Hahahahaha. Sim, na verdade eu sei sobre tudo o que rola por aqui” ela piscou pra mim. “Mas não sei se seria certo te contar, muita coisa é informação privada” e eu pude notar sua vontade de compartilhar as informações.
“Minhas prediletas” eu sorri e pisquei pra ela.