domingo, 12 de setembro de 2010

Consumida

Prólogo

Às vezes as coisas que nos acontecem simplesmente fogem do controle. É exatamente assim que acontece quando somos consumidos por algo. E no meu caso eu fui consumida por um sentimento tão poderoso que ele foi capaz de transformar minha vida de cabeça para baixo...

Parte 01

“Betina, é sério, você realmente deveria parar com isso” minha amiga, melhor amiga na verdade, a Duda, me repreendeu quando eu contei pra ela que tinha colado em toda a prova de física daquele bonitinho CDF.
“Duds” esse é o apelido que eu dei pra ela quando tínhamos seis anos e desde então eu a chamo assim. “Se eu não tivesse feito isso, eu vou acabar perdendo de ano, sério, olhe, pense bem... Nem todo mundo consegue tirar notas tão boas como as suas” falei dando de ombros enquanto eu comia minha coxinha com catupiry.
“É, isso é porque eu estudo! Você devia começar a estudar sabe? Estamos no terceiro ano. No final teremos que prestar vestibular e assim você não irá aprender nada, o Henrique não estará lá pra você pescar dele” essa era a décima conversa sobre esse assunto que tínhamos essa semana. Eu sinceramente não agüentava mais tanto papo furado.
“É, eu sei. Você tem razão” era a melhor forma de fazê-la calar a boca, mudar de assunto. “Prometo que vou mudar” sorri sabendo da enorme mentira que eu havia contado.
“Sei” ela respondeu ceticamente, é, ela me conhece. “E o Gustavo? Ele te ligou ontem?”
“Ligou, mas eu não atendi não. Sei lá, não estou mais tão afim dele” dei de ombros novamente colocando ketchup em cima da coxinha. Estava realmente boa, fazia tempos que eu não comia uma assim.
“Não atendeu? Você é doente? Vei, qual é o seu problema? Como assim você não atendeu?!” ela disse aos berros. Eu já esperava por essa reação dela e é por isso que eu não tinha contado antes. Esperava que ela fosse esquecer de perguntar, doce ilusão.
“Não to afim dele, Duds. Ele é legal e tudo o mais, mas não me...” nem pude terminar porque ela interrompeu gritando de novo.
“Oh meu Deus! Eu SABIA que você está doente. Bê, ele é MUITO LINDO E GOSTOSO. Um deus grego daquele cai no seu colo e você diz não?! Sério?” ela apenas me encarava totalmente incrédula.
“Eu sei disso” eu suspirei. “Mas fazer o que? Não é ele quem eu realmente quero” e então desviei meus olhos dela para olhar quem estava um pouco mais atrás dela na cantina comprando uma coxinha com catupiry também.
Ela obviamente viu que eu não estava mais olhando pra ela e seguiu meu olhar e deu um suspiro ainda mais fundo que o meu.
“O Miguel?! E eu achando que você já tinha superado isso” ela balançou a cabeça em negação.
“Eu... Superei” era mentira e eu e ela sabíamos muito bem disso.
“Claro, é exatamente isso que está escrito na sua cara mesmo. Bê, pra não sentir desejo algum por um cara como o Gustavo, só sendo cega ou estando apaixonada por outro, completamente apaixonada” ela balançou a cabeça mais uma vez e me lançou aquele olhar de “você não tem jeito mesmo”.
“É, mas Duds, o que eu posso fazer? Acho que... Eu realmente, realmente gosto do Miguel” olhei pra ele mais uma vez sentindo uma tristeza crescendo.
“Não, você não gosta dele. É sério. Isso virou obsessão. Você só continua a querer ele, porque ele te deu um fora e você não agüenta levar um fora. Encare os fatos, Bê. Ele não te quer, e outra, ele nem é tudo isso assim, ele é bonitinho, INHO. Já o Gustavo é tão ÃO. Fala sério, não tem nem comparação. Além do Gustavo ser melhor que ele, o Gustavo quer você. Hei, olha pra mim” ela disse estalando os dedos tirando toda a minha concentração do Miguel.
Ele estava ao longe conversando com os amigos. Ele parecia feliz e estava rindo muito de algo. Antes da Duda tirar minha atenção dele, ele tinha olhado pra mim na mesma hora que eu estava olhando pra ele e eu senti uma sensação quente por dentro. Eu SEI que ele me quer. Ele me quer, né?
“O Gustavo é tudo de bom, mas não é o Miguel” falei voltando pra minha coxinha.
“Certo. E isso é ótimo. Se não quiser o Gustavo, por que não fica com o Marcelo? Ele também é bonito e está afim de você” ela realmente iria citar todos os caras que estavam afim de mim querendo que eu não ficasse mais com o Miguel?
“Eu sei que ele é, eu também acho e até estava afim de ficar com ele, Dud. Mas... Não sei, eu acho que, já que esse é o nosso último ano aqui, eu preciso é correr atrás do que eu quero né? Depois eu nunca mais verei o Miguel de novo”.
“Oh a merda... Mas tanto faz, a vida é sua, você que sabe, só depois não venha me dizer que eu não avisei, porque bem, eu avisei” ela então foi tarar um bonitinho amigo do Miguel que ela é super afim.
Eu me aproveitei da situação e decidi mandar um sms pra ele. Fazia uns 2 ou 3 meses que eu não falava com ele, mas eu simplesmente não agüentava mais. Eu precisava disso. Então eu escrevi um sms que dizia “Qnt tempo hein?” e enviei, nada demais, mas para um bom entendedor dizia muito.
Instantes após eu o vi mexendo o celular e sorrindo. Ele digitou algo de volta e um minuto depois eu recebi uma mensagem. “Muito tempo, assim eu fico com saudades” e eu sorri ao lê-la. Opa! Eu não disse que ele me queria?
Então eu digitei de volta “Saudade pode ser facilmente resolvida” e ele leu a mensagem e ficou me olhando de longe com um claro desejo de vir falar comigo, porém ele não veio. E recebi de volta uma mensagem dizendo “Bom saber, pq eu quero msm resolver”.
Pronto, eu tinha conseguido o que eu queria. Uma confissão dele de que ele me quer. Eu não respondi essa mensagem e nem responderia. Eu estava satisfeita por enquanto.
“Bê, esquece esse garoto, é sério. E vamos pra aula, o Toni já passou” o Toni era o nosso professor de biologia que é a aula que teríamos agora depois do intervalo. Duas aulas.
Duas aulas chatas, mas que passaram rápido. Infelizmente eu não poderia ir embora ainda, porque eu teria que ir até a sala da coordenadora porque ela queria conversar comigo sobre um projeto que eu sugeri. Então eu fui andando e de repente eu congelei com a cena que eu estava vendo.
Não tinha mais ninguém por perto, somente duas pessoas se agarrando de forma muito, muito indecente. Eu senti o chão se abrindo aos meus pés quando eu vi quem era o garoto.
“Miguel...” eu falei sussurrando de modo que somente eu poderia ouvir. Ou assim eu achei. Na mesma hora que eu falei o nome dele a garota se afastou dele e olhou pra mim no mais profundo ódio.
Ele olhou pra ela assustado e se virou para olhar na minha direção.
“Betina?” ele falou surpreso.
“Surpreso?” não consegui deixar de lado a raiva profunda e crescente que eu estava sentindo. Se ele estava ficando com outra, se ele queria ficar com outra, por que porra ele veio dar em cima de mim? Aff!
“Eu...” ele começou, mas se calou logo. Ao invés disso a garota que estava ao lado dele continuava a me olhar com raiva.
“Então é você... A garota que ele falou” ela riu em desprezo. Quer dizer então que além de tudo, ele estava de conluio com ela? Oh que bom saber. Eu estava com muita raiva, muita mesmo.
“Nah, não! Deixa a Betina em paz, é sério. Por favor” ele pediu quase em súplica pra ela. O que era isso tudo? Ela me deixar em paz? Ela que tentasse me infernizar!
“Não! É ela mesmo...” ela riu dele. “Não é? Sim, eu posso sentir seu coração. É ela” o que porra estava acontecendo aqui? Sentindo o coração dele? Como assim? Eu não estava gostando nenhum pouco disso.
De repente ela estendeu as mãos pra frente e as fechou bem rápidamente e eu comecei a sentir uma dor imensa em minha cabeça e que aos poucos foi se espalhando pelo meu corpo. A agonia era tão grande que eu queria morrer. Que porra era aquela? Ela que estava fazendo aquilo comigo? Não, não era possível.
“Nah, deixa a Betina ir embora, por favor. Eu prometo... Eu te prometo o que você quiser, mas por favor, a deixe ir” eu não podia vê-lo mais já que eu estava no chão me contorcendo de dor, mas pela voz dele ele parecia completamente desesperado. Mesmo no meio de tanta dor a raiva que eu sentia por ele ainda era crescente e estava cada vez se tornando maior. Quanto mais eu via e sentia mais eu tinha raiva dele. Ele nunca tinha sido bom pra mim afinal de contas. Namoramos durante seis meses e ainda assim ele só era bom comigo quando era conveniente pra ele. É isso, me sentir mais usada que isso seria impossível. Eu o odiava com todas as minhas forças.
Eu estava sentindo tanta dor que eu queria morrer. NÃO! Eu não posso morrer! Eu preciso ficar viva pra poder me vingar dele. Eu não sabia como agüentaria a dor, mas eu teria que agüentar, eu não podia morrer. Eu queria viver, eu queria viver e acabar com ele. Nunca mais deixá-lo fazer isso comigo e nem com ninguém.
“Ela é forte” a garota riu ainda mais e ainda mais maldosa. “Pelo visto você não tem tão mal gosto assim, meu amor” ela disse calorosamente. Meu amor? Eles tinham mesmo um caso então.
“Lógico que não. Eu amo você, não é mesmo? Como poderia ter mal gosto?” certo. Aquilo foi o fim. Eu precisava ir até ele e arrancar a cabeça dele do pescoço. Mesmo sentindo muita dor eu me obriguei a levantar e consegui bem devagar e ainda sentindo a dor me consumindo.
“Seu... Filho... Da... Puta” eu falei com dificuldade. “Você... vai... me pagar” então eu caí de joelhos novamente sentindo mais dor ainda.
“Não resista sua idiota. Está quase acabando. Posso sentir sua vida indo embora” ela riu mais uma vez. Então eu abri meus olhos e ela estava com os lábios dela nos dele enquanto eu estava lá, morrendo na frente dele e ele não fazendo nada.
“Não!” eu gritei e então tudo ficou vermelho.
“Não! Era pra você estar morta. Como pode estar em pé? Não é possível” a garota dizia apavorada. Eu gostei disso.
“Yeah. Você me matou. Estou morta. Eu posso... Sentir muita coisa. Me sinto mais forte, me sinto poderosa. Yeah, eu gosto disso. Meu coração não bate mais” falei rindo lambendo os lábios.
“Betina?” o Miguel perguntou cauteloso.
“Cale a boca. Eu cuido de você mais tarde. Primeiro ela” então eu fui até a garota e ela tentou correr, mas eu a alcancei muito facilmente.
“Céus! Você é um demônio! Miguel, socorro! Socorro! Eu criei um demônio” ela disse em desespero.
“Se vira, não irei me meter. Eu avisei” ele deu de ombros mal ligando pra ela. Ele era mesmo um imbecil covarde que merecia sofrer.
“Morra!” falei pra ela e quebrei seu pescoço. Pude sentir todo um poder me invadindo. Eu estava sugando os poderes dela? Hum, gostei. “Agora você” eu disse olhando pra ele.
“Hei, calma. Você não vai me matar também né? Eu tentei proteger você, mas ela era um demônio, eu não tinha como lutar contra ela. Eu... Gosto de você, você sabe” ele disse nervoso.
“Tenho certeza que sim” então eu segurei o rosto dele entre minhas mãos e o beijei com toda a fome que eu sentia por ele. Depois que eu me afastei dele eu me senti ainda mais estranha. Quando eu vi um arco e flecha estava na minha mão. E a ponta da flecha era um rosa com brilho.
Quando eu olhei pra ele, ele ficou me olhando completamente apatetado. Que porra foi essa?
“Que foi?” eu perguntei com agora um certo nojo dele.
“Eu te amo” ele falou sorrindo com o sorriso que antes me fazia derreter.
“Problema é seu” respondi friamente. Eu o amava também. Eu sentia isso mais do que antigamente, porém alguma coisa mudou e eu não conseguia mais me entregar como antes.
“Não... O problema é nosso. Eu amo você e vou lutar por você. Você é o amor da minha vida, no tempo em que passamos separados pude perceber isso” as palavras dele me fizeram sentir aquela quentura de novo e eu sorri.
“Sei como é. Mas... Por sua causa eu morri e eu ainda tinha muita coisa pra viver. Por sua causa eu estou condenada a isso, seja lá o que isso significa” meu ódio por ele era muito, muito grande. Eu realmente tinha sido consumida por esse sentimento.
“Me desculpa, mas eu... Eu não pude impedir. Eu amo você” ele falou chegando perto e acariciando meu rosto.
“Tenho certeza que sim. Apesar de eu ainda amar você, não sinto mais vontade de fazer isso acontecer. Se eu estou condenada, você também está. Você irá passar o resto da sua vida sem amar mais ninguém além de mim, eu sou a sua alma gêmea e nunca irei retornar pra você porque eu estou amaldiçoada neste corpo” então eu olhei pra flecha em minha mão mais uma vez.
“Eu...” ele começou, porém se calou.
“Eu vou impedir todos os caras como você. Se quiserem fazer alguém sofrer por amor, terão que passar por cima de mim primeiro” ao dizer tais palavras eu senti a flecha pulsando em minhas mãos.
“E como pretende fazer isso? Você não tem o poder sobre isso” ele disse rindo. Eu fiquei com mais raiva ainda. Felizmente eu não precisei pensar muito e as palavras apenas fluíram de minha boca.
“Atirarei uma de minhas flechas e eles serão tomados por uma profunda paixão para a primeira pessoa da preferência de sua sexualidade que olharem” respondi firmemente. “Irei proporcionar a todos que eu puder, sentir o amor que nunca pude sentir” olhei pra ele tristemente.
Ele apenas ficou me olhando da mesma forma de volta. E eu sorri pra ele. Tentei tocar na mão dele, mas eu não consegui. Ele também tentou tocar na minha e não conseguiu. Então eu apenas estendi a ponta da flecha pra ele segurar e eu a segurei na outra. Não sei por quanto tempo ficamos assim nos olhando e desejando...

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